Por Orlando BarrozoA partir deste ano, na hora de escolher um TV novo o consumidor deverá ficar atento ao selo “Ultra HD Premium”. Essa será a distinção, feita pelo próprio fabricante, para seus TVs top de linha, que atendem as regras de uma classificação específica, criada pela UHD Alliance. Essa entidade, que reúne a maioria das empresas do setor (não apenas fabricantes, mas também estúdios de cinema, produtores e desenvolvedores de softwares e aplicativos), decidiu que criar o selo seria a melhor maneira de explicar ao consumidor os benefícios do padrão UHD.
A princípio, todo TV 4K (UHD) reproduz imagens com a mesma qualidade; na verdade, a mesma resolução: 3.840 x 2.160 pixels. Mas os modelos identificados como “Premium” trazem uma série de recursos adicionais, muito valorizados pela Alliance, que definiu as especificações no início do ano. Elas devem ser usadas pelos fabricantes de TVs, players e projetores, e também pelos produtores de conteúdo. Quais são esses recursos?
Faixa dinâmica – O padrão oficial chama-se HDR (High Dynamic Range). Refere-se a um tipo de processamento de vídeo em que se alcança o nível mais amplo de luminância: do branco mais claro ao preto mais profundo. Para as empresas que integram a Alliance, o uso desse processador é gratuito. Mas algumas – Philips e Vizio, por enquanto – estão preferindo pagar royalties para utilizar o software Dolby Vision, que aparentemente traz os mesmos resultados. A LG foi a única que optou por oferecer TVs compatíveis com os dois padrões.
A profundidade de cores em 10-bit ou 12-bit é uma das exigências da UHD Alliance
Profundidade de cores – Os TVs Premium utilizam padrão 10-bit ou 12-bit, enquanto os outros 4K podem trabalhar com 8-bit. A diferença é que a chamada paleta de cores é mais ampla, com muito mais variedade de tons. Um filme em Blu-ray, por exemplo, é gravado atualmente em 8-bit, o que significa 256 gradações para cada cor primária (vermelho, verde e azul) e suas cores derivadas. Os discos Blu-ray 4K, que estão saindo no mercado internacional, já têm obrigatoriamente 10-bit, e isso permite até 1.024 gradações de cor.
Gama de cores – Esse é um parâmetro diferente. É o chamadocolor gamut: a amplitude da representação visual do espectro de cores e a capacidade do display exibi-la. Mesmo com 10-bit ou 12-bit, podem haver variações nessa amplitude, e a Alliance agora determina que seja usado como referência o padrão Wide Color Gamut BT.2020 (também conhecido como Rec.2020), oficial da UIT (União Internacional de Telecomunicações). Essa especificação está causando certa confusão entre os especialistas. A Alliance recomenda que os TVs reproduzam “pelo menos 90%” da gama BT.2020, enquanto os discos devem ser gravados com 100%.
Para TVs OLED, a Alliance definiu especificações menos rígidas, devido à superioridade dessa tecnologia.
Luminosidade – Aqui, as coisas se tornam mais complicadas devido às diferenças entre os tipos de display. LCD e OLED utilizam métodos diferentes para gerar a luz que permite criar imagens vivas e convincentes. Também diferem na questão do ajuste de nível de preto (black level), que por sua vez influi diretamente na relação de contraste. Para os TVs Premium, a Alliance decidiu que é preciso atingir um mínimo de 1.000 nits; cada nit equivale a 1 candela por metro quadrado (cd/m2); cada candela corresponde à luz de uma vela acesa, medida a 1m de distância. Nos TVs 4K comuns, admite-se picos de 540 nits (nos modelos atuais, a taxa gira em torno de 400 nits).
É importante observar aqui a distinção que a Alliance faz entre os tipos de display. Para os LCDs, a exigência é de 1.000 nits com nível de preto máximo de 0,05 nits; isso equivale a uma taxa de contraste de aproximadamente 20.000:1. Para os displays OLED, exige-se 540 nits, com preto máximo de 0,0005 (ou 1.080.000:1 de contraste). Notem a diferença. Mas há uma “pegadinha” denunciada pela fabricante americana Vizio (confiram mais à frente).
Para atingir 1.000 nits, é imprescindível utilizar backlight do tipoLocal Dimming, mais caro e (por isso mesmo) raramente usado. No entanto, a Alliance não incluiu esse tipo de painel entre as suas especificações de referência. Seria pressão dos fabricantes?
Já a taxa de 540 nits é facilmente atingida pelos displays OLED, que não necessitam de backlight, e aqui a especulação é de que houve pressão da LG, única fabricante atual desse tipo de painel.
O TV Samsung KS9500 SUHD, de 88”, um dos primeiros que irá portar o selo “Premium”.
Essa série de regras, digamos, não muito claras está provocando não apenas controvérsia entre os especialistas, mas entre os próprios fabricantes – justamente os que, na prática, as definiram. A Sony, por exemplo, decidiu que não usará o selo “Premium” em nenhum de seus aparelhos. Prefere identificá-los como “Sony UHD 4K”. A Samsung concordou, mas acaba de lançar seu primeiro player Blu-ray 4K sem o selo, o que certamente irá provocar confusão entre os possíveis compradores.
Outra que protesta é a Vizio, hoje a marca mais vendida no mercado americano (a empresa também possui sócios chineses). Há cerca de duas semanas, divulgou um comunicado contestando os critérios da Alliance, especialmente nos tópicos referentes à luminosidade. Esse parâmetro, diz a Vizio, foi calculado apenas sobre a área central da tela, e não sobre a superfície total, o que distorce a medição. Numa espécie de represália, a empresa decidiu não adotar o padrão HDR da Alliance, e sim o Dolby Vision, que é similar.
O selo será usado para identificar TVs, projetores e players mais avançados
Na última CES, em janeiro, praticamente todos os fabricantes exibiram seus modelos “Premium”, embora alguns apenas como protótipo. A princípio, LG, Samsung, Philips e Panasonic aceitaram as regras da Alliance e começam a lançar produtos com o selo a partir deste mês nos mercados europeu e americano. A Panasonic, além da linha Viera DX902, lança também o player Blu-ray 4K UB900.
Primeiro player Blu-ray 4K lançado no mercado, da Panasonic: compatível com as novas regras.
As polêmicas são estranhas porque a Alliance foi formada exatamente com a missão de criar padrões claros e que sejam fáceis para o consumidor entender (é o que está escrito em seu estatuto e reafirmado no site uhdalliance.org). Do consórcio, além dos fabricantes, fazem parte potências como Fox, Disney, Warner, Microsoft, DirecTV, Amazon e Netflix (veja aqui a lista completa). E, no entanto, pelo menos até agora, somente a primeira está utilizando o tal logo “Premium”.
Questionada pelo site CNET, a direção da Alliance divulgou nota explicando que o uso do logo “não é obrigatório” e que alguns produtos podem até “exceder as especificações”. Nesse caso, qual seria então a utilidade das normas? Até agora não foi explicado.